sábado, 2 de abril de 2016

Comunicadores lançam manifesto contra o Impeachment

PABLO RODRIGO

Cerca de 200 jornalistas, publicitários, radialistas e fotógrafos que atuam em Mato Grosso lançaram o “Manifesto Pela Democracia”. O documento é contrário ao impeachment proposto para derrubar a presidente da República Dilma Rousseff.

No documento, que está sendo divulgado nas redes sociais e será entregue ao coordenador da bancada federal mato-grossense no Congresso Nacional, deputado federal Fábio Garcia (PSB), aponta para uma reflexão profunda acerca do momento político nacional que “pode levar o Brasil à quebra da ordem constitucional”, diz um dos trechos da carta.

Outra preocupação dos profissionais da Comunicação é que tal movimento pela derrubada da presidente Dilma poderá colocar em xeque as garantias constitucionais previstas em um Estado de Direito, bem como das liberdades de expressão e de imprensa.

Para a professora de Jornalismo da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT), Janaína Pedrotti, o manifesto serve para que a população possa refletir sobre o rumo que a política brasileira está tomando. “Se assistirmos às sessões das Câmaras dos Deputados, temos a nítida impressão de que o rumo da nossa política virou torcida de futebol. Ninguém mais discute leis, projetos, apenas manifestações de torcidas. E isso não é sério. Então entendemos que o jornalismo tem o papel de levar a população a refletir. E isso não vem ocorrendo na grande imprensa nacional”, explicou Janaína, que assinou o manifesto.
Janaina Pedrotti, docente do curso de Comunicação Social da UFMT
(Foto: Reprodução)

A professora também aponta que o risco à democracia é visível e já vem ocorrendo diante da conjuntura atual. “Em um estado democrático de direito, existem direitos básicos e constitucionais que não estão sendo respeitados. Se analisarmos a condução coercitiva de vários investigados, sem ao menos convoca-lo para prestar esclarecimentos, já é algo grave. Se um ex-presidente da Republica sofre isso, o que poderão fazer com uma pessoa qualquer? Então as coisas estão acontecendo de uma maneira assustadora. E quando os direitos constitucionais são desrespeitados, tudo pode acontecer”, analisou.

Por outro lado, alguns profissionais da comunicação decidiram não assinar o manifesto. A jornalista Laíse Lucatelli explicou que não aderiu ao movimento por não concordar com a redação do documento, mas afirmou que é contra o impeachment. “Sou contra o impeachment que está aí. Isso não resolveria nada, além de que está sendo conduzido de maneira errônea. Mas também não concordo com o teor do manifesto que vários amigos assinaram. Respeito todos que assinaram, mas me pareceu muito próximo do discurso do governo e do partido da presidente. Talvez se a redação fosse menos politizada, assinaria”, disse Lucatelli que atua há seis anos no jornalismo político.

O movimento que aglutinou vários profissionais da comunicação vem recebendo apoio de várias pessoas que também já solicitaram assinar o manifesto.

Posicionamentos como este em Mato Grosso vêm se tornando comum no Brasil. Os Jornalistas Livres, Barão de Itararé e Mída Ninja já atuam em várias frentes, desde as manifestações junho de 2013, que ocorreu em várias cidades do país.

Recentemente a Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) divulgou uma nota contra o processo de impeachment, acusando o movimento de "golpe" e que poderia trazer de volta o estado de exceção, como em 1964, quando foi instaurada a ditadura militar no Brasil. Já a Associação Brasileira de Imprensa (ABI) não se posicionou sobre o assunto e vem sofrendo várias críticas de muitos jornalistas.

Confira na íntegra o manifesto dos comunicadores de Mato Grosso:

MANIFESTO PELA DEMOCRACIA
Nós, profissionais de comunicação de Mato Grosso, abaixo assinados, vimos a público manifestar repúdio às tentativas em curso de um golpe midiático, judicial e parlamentar. Entendemos que a defesa intransigente de um impeachment da presidente da República, sem profunda reflexão e cuidado, pode levar o Brasil à quebra da ordem constitucional. Não estamos em defesa de partido A ou B, e sim da democracia, das garantias constitucionais previstas em um Estado de Direito, bem como das liberdades de expressão e de imprensa.
Essas prerrogativas são caras para a nossa profissão. Não aceitaremos que o Brasil vivencie novamente o que ocorreu em 1º de abril de 1964, com a derrubada do então presidente da República, João Goulart, e o estabelecimento de 21 anos de uma ditadura militar que censurou, prendeu, torturou e assassinou quem se insurgia contra o regime de exceção, muitos deles nossos colegas.
Repudiamos as manobras do judiciário, em que magistrados acionam dispositivos ilegais, com foco no escândalo, que causam acirramento de ânimos da população, para gerar convulsão social.
Repudiamos a linha editorial escusa e desonesta de grandes veículos que – tripudiando do importante papel de formação da opinião dos brasileiros, utilizando de concessões públicas irregularmente, usufruindo do problemático mito da imparcialidade no jornalismo e incitando o ódio e a violação dos direitos humanos – tem conduzido a indignação popular seletiva, na ânsia de derrotar o partido do governo.
Para completar o quadro, o Congresso Nacional vem conduzindo, a toque de caixa, o processo de impeachment contra a presidente da República, sem base legal, apesar de muitos parlamentares responderem, na condição de réus, por crimes de corrupção.
Enquanto comunicadores, não podemos aceitar em silêncio tal fato.
Defendemos, sim, a punição de responsáveis por corrupção em qualquer esfera, bem como a utilização da prerrogativa do impeachment - um dispositivo constitucional e legítimo, que protege o povo de ilegalidades de gestão. No entanto, não podemos nos silenciar diante do quadro atual em que, vale repetir, setores da Mídia, do Judiciário e do Parlamento conduzem suas ações, nos envolvendo em clima similar aos pré golpes de Estado ocorridos em outros países da América Latina, como Paraguai e Honduras.
Exigimos, portanto, a transparência na condução dos três poderes, a fim de que cumpram suas competências legais.
Ainda que o profissional de comunicação não possa ser confundido com a empresa onde trabalha (embora algumas delas não permitam que manifestem sua posição pessoal em casos como esse), convidamos a exercer sua atividade com foco no papel social que desenvolve, considerando que a manipulação da informação no cenário atual tem contribuído para a perda da credibilidade de parte das empresas de comunicação e também para o desrespeito à profissão.
Propomos a valorização da informação jornalística, o amplo debate público sobre o papel do Judiciário e dos poderes constituídos, bem como dos meios de comunicação, das instituições e dos movimentos sociais na construção do futuro do país e de seu povo.
Para fortalecer a democracia brasileira, é preciso dar um basta às ações e movimentos autoritários de quem quer que seja. É preciso bradar! Que não aceitemos mais nenhum golpe.
Não vai ter golpe!
Viva a democracia!

Nenhum comentário:

Postar um comentário